sábado, 28 de março de 2009

O Exterminador (1980)


Em 1980 as feridas causadas pela guerra do Vietnã ainda estavam doloridas em um país assolado pela crise econômica, reflexo ainda da década anterior. A renda diminuiu, assim como o poder aquisitivo, trazendo com o espectro da recessão não só o aumento da criminalidade quanto um recrudescimento do conservadorismo. O que culminou com a eleição de Ronald Reagan para a presidência, uma interessante metáfora, já que um ex-ator de direita assume o poder ao mesmo tempo que nas telas, novos heróis de caráter conservador (mas de forma alguma atrelados ao poder político, geralmente ineficaz e ganancioso) tentam restabelecer de forma truculenta, solitários, o sonho americano perdido.
Personagens como esses já eram bem conhecidos do público – caráter moldado nos westerns -, sendo os mais emblemáticos até então o policial Harry Callahan (Clint Eastwood) de Perseguidor Implacável (Dirty Harry, com três produções entre 1971 e 1976), e o vigilante Paul Kersey (Charles Bronson) de Desejo de Matar (Death Wish, 1974). Este último mais radical ao tomar para si a execução da justiça frente a inoperância dos poderes estabelecidos, principalmente por não estar submetido – como Harry Callahan – a um código institucionalizado. E é Paul Kersey a inspiração mais direta para John Eastland, personagem principal de O Exterminador (The Exterminator/1980). Produção de 1980 dirigida por James Glickenhaus, que já tinha no currículo o terror B Suicide Cult (1975) e futuro produtor executivo de pérolas como Maniac Cop (1988), Basket Case 2 (1990), e do ótimo Frankenhooker (1990). Autor também da história, Glickenhaus tem a grande sacada de adicionar à trama batida do justiceiro urbano um tempero extra: as agruras dos veteranos do Vietnã lutando para encontrar um lugar na sociedade e lidar com os traumas vivenciados no campo de batalha. Apelo que funciona e dá ao filme um caráter singular, fazendo com que fosse algo mais do que um simples e esquecível filme de ação.
A violenta seqüência de abertura, com um grupo de soldados aprisionados sendo martirizado pelo inimigo vietcong, faz com que lembremos de imediato dos ainda recentes O Franco Atirador (The Deer Hunter/1978), de Michael Cimino e Apocalipse Now (1979), de Francis Coppola. É nesse cenário infernal que a vida do soldado John Eastland é salva por seu colega de farda Michael Jefferson, fazendo surgir uma forte amizade. Ligação interrompida violentamente anos depois, quando os dois ex-combatentes, modestamente empregados, são obrigados a colocar para correr uma gang que roubava o depósito onde trabalhavam. Como vingança, os bandidos atacam Michael, que fica tetraplégico. Inconformado, Eastland massacra o bando e resolve, a partir daí, sair pelas ruas usando suas técnicas militares (um pré-Rambo) para livrar a sociedade dos elementos mais perigosos. Auto-denominado “O Exterminador”, suplicia de forma violenta e criativa (tiros, lança-chamas, etc.) os personagens mais sórdidos, enquanto é procurado por um policial íntegro (o veterano ator Christopher George, figura recorrente nas séries de tv da década de 70) e pelas autoridades ineptas e corruptas. Fica patente o desprezo pelos políticos e órgãos governamentais: o prefeito, preocupado com a reeleição, manda a Cia (sugerindo um conluio com Washington) para caçar o vigilante; e um dos justiçados é senador, nas horas de lazer torturador sexual de jovens em sinistra casa de prostituição.
O Exterminador é uma filme que, mesmo envelhecido esteticamente e com algumas incoerências, merece nossa atenção e funciona. Inclusive na inexpressividade de Robert Ginty para construir um John Eastland apático, mas também calculista e frio. Algumas seqüências são memoráveis: o ataque à casa de prostituição que explorava menores, o confronto com o dobermann ( o cão mais querido do cinema nos anos 80, imagine só...) e a morte do chefão mafioso no moedor de carne industrial. Teve uma continuação medíocre em 1984.