quinta-feira, 23 de maio de 2013

Black Power Jones (2013)



Na década de sessenta do século passado, após importantes mudanças na legislação referentes ao racismo e a mobilização dos negros norte-americanos na segunda metade dos anos 1950, as manifestações pelos direitos civis ganharam força. Resultando na aprovação da lei que proibia qualquer forma de discriminação baseada em cor ou raça. Mas apesar disso, as coisas esquentaram, com a radicalização do movimento e violentos confrontos, culminado em crimes de morte - como os assassinatos do líder radical Malcolm X e do pacifista Martin Luther King - e a criação do grupo Panteras Negras. Nesse cenário, embalado pela música soul e pelo que ficou conhecido como movimento Black Power (de ampla abrangência artística, cultural e ideológica), surge uma nova tendência cinematográfica denominada blaxploitation. Fusão óbvia das palavras black e exploitation (como eram chamados os filmes produzidos à margem do código de ética cinematográfico em vigor desde a década de 1930, que exploravam temas não permitidos nas produções dos grandes extúdios), o filão tem como início – ou pelo menos existe um consenso sobre isso – o independente  Sweet Sweetback’s Baadasssss Song (1971), de Melvin Van Peebles. Produção que, segundo Todd Boyd “mesclou o modernismo europeu e o avant garde com as demandas urgentes do movimento negro que ecoavam sentimentos semelhantes aqueles articulados nas ruas dos Estados Unidos dos anos 1970”[1]. Por outro lado, no mesmo ano, a major MGM lançou Shaft, dirigido por Gordon Parks, com Richard Roundtree no papel título, deflagrando uma série de produções que, a partir dos paradigmas estabelecidos pelo filme de Peebles, se imiscuíram nos mais diversos gêneros cinematográficos, como comédia, horror, artes marciais, etc. Os filmes blaxploitation tiveram seu período áureo na primeira metade dos anos 70 angariando defensores e detratores, dentre esses últimos as próprias instituições representativas do movimento negro, que os acusavam de caça-níqueis que perpetuavam os estereótipos estabelecidos pelos brancos acerca dos negros. Contudo, é inegável a influência desses filmes em produções mais recentes, além de constatar, com o afastamento de quatro décadas, as qualidades de muitos deles.


Black Power Jones (2013), produzido e roteirizado por Geraldo Lima e Igor Simões Alonso (New Hope Produções), que também dirigiu, bebe nessa fonte e vai além. Conta a história de um violento bando criminoso, liderado pelo facínora Block (Geraldo Lima), que vive de golpes e extorsão. Em uma tentativa de manipular a seu favor os resultados de lutas de boxe clandestinas, entram em confronto com o boxeador Jones (Francisco Soares), enquanto sobre eles fecha o cerco uma dupla de policiais (Silvana Veloso e Igor Simões). O filme é rico em referências cinematográficas, começando pelo título que remete a Jones, o Faixa Preta (Black Belt Jones, 1974), blaxploitation de artes marciais estrelado por Jim Kelly. Também a ambientação setentista, criada de forma criteriosa através dos cenários, figurinos e objetos de cena são fundamentais para a construção da atmosfera, valorizada pela iluminação e fotografia de Geraldo Lima, elementos responsáveis por realçarem as cores e tornar consistentes os ambientes onde se desenrola a trama. Vale destacar o trabalho dos atores, alguns profissionais, mas a maioria deles amadores arregimentados pelos produtores, em caracterizações marcantes como André Chechinel (o capanga de Block, Capeta), Silvana Veloso (a delegada Rochelle) -  lembrando a musa black Pam Grier -, entre outros. As interpretações, exageradas e em certos momentos caricatas, acabam se revelando oportunas.


 Aliadas aos diálogos dão à narrativa um saboroso ar nonsense que em muito lembra, por um lado, as histórias em quadrinhos do período, como por outro, arremedam a estética camp. Dando ao filme um eficiente ar de brasilidade brega (notadamente nas cenas do bilhar) que o articula aos policias baratos rodados na Boca do Lixo nos anos 1970 por diretores como Francisco Cavalcanti e Toni Vieira. É essa mistura estética, de blaxploitation com Boca do Lixo, que dá Black Power Jones uma inegável vitalidade. Produzido de forma independente, com pouquíssimos recursos, é mais uma prova de que é possível criar obras audiovisuais no país com qualidade, sem apelar para a salvaguarda do rótulo “trash”.


Maiores informações sobre o filme e o DVD:



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