Em meados da década de 1970 eu tinha por hábito, na saída do colégio onde cursava o primeiro grau no Rio de Janeiro, fazer uma visita à Entrelivros (uma rede de livrarias) no caminho de casa. Apesar de jovem, já alimentava meu imaginário com coisas pouco usuais para o que se convencionava ser um adolescente sadio e já prenunciava os rumos que minha vida iria tomar: monstros e bizarrices. Que procurava invariavelmente nos livros, quadrinhos (as editoras brasileiras eram prolíferas no gênero) e nas madrugadas passadas na frente do velho televisor preto e branco. Passava longe dos cinemas onde a censura impedia meu ingresso para assistir às produções que versavam sobre meu tema preferido, taxadas como impróprias para menores de 18 anos. Numa dessas peregrinações à Entrelivros encontrei o recém lançado no Brasil (Record,1975) Drácula: Mito ou Realidade, de uma dupla de acadêmicos: o norte americano Raymond T. McNally e o romeno Radu Florescu. Originalmente intitulado In search of Dracula: a true history of Dracula and vampire legends, a obra que resultava nas investigações dos pesquisadores trazia nova luz para os estudos do vampirismo, desvendando as origens históricas do personagem imortalizado por Bram Stoker: o príncipe da Valáquia Vlad Tepes.
Alguns anos mais tarde descobri, em meio ao bagunçado mercado de filmes em vídeo dos anos 1980 – nunca consegui entender a diversidade de distribuidoras de VHS e sua falta de critério na seleção de títulos – a versão cinematográfica do livro de McNally e Florescu: A Verdadeira História de Drácula (In Search of Dracula), distribuído pela F. J. Lucas. Produção original de 1975 da Aspekt Films sueca (apenas três anos após sair do prelo o livro em que se baseava), trata-se de um documentário que tenta reproduzir a estrutura elaborada pelos pesquisadores (que contribuíram com a roteirista). Seguindo os moldes do documentário clássico, com narração over e cenas recriadas, o filme dirigido pelo inglês Calvin Floyd passou longe de ser bem sucedido. Ainda que McNally e Florescu justifiquem esse fracasso (na versão atualizada do livro, lançada aqui em 1992 pela Mercuryo) ao fato da produção ser “bem falante e intelectual demais para ser um sucesso comercial”, é na falta de uma linha narrativa a ser seguida que vamos encontrar o motivo principal. O documentário, levado à cabo pela mão pesada de Floyd, não se sustenta nessa pretensão de seriedade, podendo mais ser alinhado aos documentários de exploração – apelidados de filmes mondo. O que não seria nenhum problema, desde que isso fosse assumido desde o princípio, tornando a obra mais divertida em seu desfile de excentricidades e toscas recriações – como a mulher nua cavalgando sobre sepulturas para identificar a cova de um vampiro. Ainda assim, tem caráter pioneiro por ser o primeiro documentário que liga Drácula ao Vlad Empalador e trata das raízes do mito do vampiro e se, para o espectador atual pareça datado e com sabor de déja vu (afinal, desde então muitos outros documentários abordaram o tema), merece a atenção por um tempero extra: a presença do ainda atuante Drácula da Hammer, o ator Christopher Lee em caracterização do príncipe romeno perfeita para aparecer como vilão de filme da boca do lixo, ostentado cabelos compridos e um bigode de fazer inveja ao jogador Rivelino. Observem a semelhança na montagem fuleira acima.
Trecho do filme:
http://www.youtube.com/watch?v=46IAZionybM
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